Durante anos, a chupeta converteu-se numa máxima pediátrica. Este artigo de que os bebés tanto gostam tinha-se tornado o culpado por os pequenos não quererem o peito materno, apanharem infecção nos ouvidos, ficarem apáticos e mal-humorados quando não chuchavam e até por os seus sorrisos serem um desastre em termos de dentição. Com o passar do tempo, a ciência desmistificou a maioria destas crenças e revelou na chucha um instrumento muito útil para crianças e pais.
Especialistas portugueses alertam, contudo, para que os benefícios do seu uso só existem até aos dois, três anos de idade no máximo. A partir daí, a criança desenvolve deformações da cavidade da boca, com consequências a vários níveis. A chucha reduz a incidência da morte súbita do recém-nascido, é um analgésico muito eficaz nos processos dolorosos e os efeitos prejudiciais que exerce sobre o correcto alinhamento dos dentes são passageiros. Quer isto dizer que, para que os dentinhos voltem ao lugar correcto, a chupeta deve desaparecer, o mais tardar, aos três anos de idade.
Não obstante, um trabalho científico publicado no último número da revista ‘General Dentistry’ acaba por deitar por terra que a ideia de que a chupeta não é tão prejudicial para a dentição das crianças. Quando um bebé introduz a tetina da chucha na boca e faz o que os especialistas denominam de sucção não nutritiva (o propósito deste acto não é ingerir alimentos), os dentes centrais inferiores desviam-se lentamente para dentro, enquanto os que se encontram no mesmo plano, mas no maxilar superior, tendem a separar-se e a sair para fora (‘dentes de coelho’). Com o tempo, os dentes caninos chocam entre si e ambas as filas de dentes não se fecham correctamente (mordida aberta).
Além disso, a sucção põe em funcionamento uma série de músculos da cara que, juntamente com a língua, fazem com que os dentes nos maxilares superiores e inferiores percam o paralelismo (mordida cruzada). Para que as malformações sejam apreciáveis estima-se que seja necessário exercer uma pressão mais ou menos constante durante seis horas diárias. O factor tempo e a energia que o pequeno aplica na sucção marcam a diferença neste aspecto.
“Isso explica porque muitas crianças que usam chupeta não desenvolvem nenhum tipo de deformação dentária”, sublinha Jane Soxman, autora do trabalho e membro da Sociedade Americana de Odontologia Pediátrica, referindo-se às crianças que usam a chucha em momentos pontuais (para ir dormir, por exemplo) ou se limitam unicamente a tê-la na boca sem chuchar.
Libério Ribeiro, da Sociedade Portuguesa de Pediatria, aponta ao CM as consequências de um uso prolongado da chucha: “A cavidade bocal adapta-se às características da chupeta e deforma a arcada dentária.” Mas não só. Segundo este pediatra do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, o céu da boca (palato) desenvolve-se de forma oval, o que prejudica a mastigação, a respiração (pela boca) e a oralidade. “Nesses casos, a criança respira mal, tem dificuldade em articular as palavras e em mastigar. Quanto mais tarde se retirar a chucha à criança [depois dos três anos] mais difícil se torna reparar essa deformação da boca.”
A longa experiência profissional diz-lhe que a maioria dos pais consegue retirar a chucha na altura devida – até aos três anos – mas “ainda existem muitos casos de chucha aos cinco e seis anos”. Nestes casos, Libério Ribeiro aconselha os pais a tirar a chucha ao filho após explicação prévia, para que o pequeno perceba a situação, e lhes dê incentivos como, por exemplo, idas a parques infantis. Esse processo deve ser feito nas férias, que permitirá aos pais e crianças descansar após noites mal dormidas.