terça-feira, 5 de dezembro de 2023

753. O médico dentista como profissional de saúde no SNS – ponto de situação

 APOMED-SP

(AssociaçãoPortuguesa dos Médicos Dentistas dos Serviços Públicos)

 

O dr. Manuel Pizarro, atual ministro da Saúde, foi somente o 19.º ministro responsável pela pasta da Saúde que não se mostrou competente na resolução da adequada integração dos médicos dentistas no SNS. Não terá sido por falta de tempo ou oportunidade, pois o ministério renegociou carreiras, criou outras e chegou até, em parcos dias a promover vertiginosas alterações não de um, mas de todos os estatutos das ordens profissionais da saúde.

De facto, desde a criação do SNS, a medicina dentária sempre foi preterida nos e pelos serviços, nunca ter havido talento para criar uma carreira de medicina dentária no SNS, que coadjuva para o lastimável estado de saúde oral, principalmente dos mais pobres e excluídos, que unicamente podem recorrer ao SNS.

Esta humilhante atitude para com os médicos dentistas dos serviços públicos tem-se vindo a manifestar ao longo das legislaturas, em repetidos e fraudulentos discursos para as legítimas aspirações dos profissionais ao verem-se reiteradamente usados como seres amestrados no circo mediático das inaugurações ou no descerrar de lápides, junto a novos gabinetes.

Mesmo a valorosa reforma ocorrida em 2016 com os projetos piloto de saúde oral, inicialmente em 13 locais das moribundas ARS-Alentejo e LVT e que, em 2017, foram alvo de alargamento a todas as restantes ARS, rapidamente se transformou naquilo que são as condições escravizantes típicas do século XXI, em que o trabalhador é simplesmente um número enquanto produtor de riqueza ao serviço do empregador, sem qualquer direito a apoio para formação, assistência na doença ou parentalidade e simultaneamente facilmente descartável em detrimento de outro que seja compelido a aceitar as mesmas, ou mais degradantes, condições de trabalho.

Exemplo destas situações é o SNS ter aproveitado, a partir de 2016, a excelente formação e qualidade dos médicos dentistas portugueses (tão solicitados e bem remunerados na Europa a custo zero para esse investimento) ao disponibilizar em cerca de 130 centros de saúde do SNS consultas de saúde oral que permitiram o acesso a centenas de milhares de portugueses que, de outra forma, nunca poderiam aceder aos mais básicos cuidados terapêuticos de saúde oral, com todas as repercussões na saúde geral e qualidade de vida que isso representou ao longo de décadas.

Concomitantemente, esses médicos dentistas têm sido contratados desde essa altura através de empresas de recrutamento de serviços ou através de contratos de prestação de serviços, que abusam desse tipo de serventia junto dos mais jovens, impelindo-os à cessação destes “tão fabulosos” contratos em situações de doença ou de simples gravidezes ou até dificultando a sua atualização formativa descontando-lhes os dias em que os mesmos participem em formação, que depois vai permitir melhor prestação de serviços.
Esta situação é a realidade atual da esmagadora maioria dos médicos dentistas avençados aos serviços públicos de saúde que exercem cumprido um horário de trabalho determinado pelo empregador e em muitas situações com controlo de assiduidade biométrico, executado em equipamento e com recurso a materiais disponibilizados pelo empregador e com replicados contratos anuais, que apesar das propaladas e válidas intenções da atual ministra do trabalho combater os designados “falsos recibos verdes” ainda não os descobriu no âmbito do SNS.

Descrito o atual ponto de situação da medicina dentária no SNS, os médicos dentistas sentem, perante esta inesperada interrupção da legislatura, que mais uma vez foram encantados por palavras vãs acerca da melhoria das condições a par da incomensurável melhoria e dedicação que estes jovens médicos dentistas trouxeram aos cuidados de saúde primários. Testemunhas disso serão, mais que os governos ou ministros, os portugueses que diariamente encontram um excelente profissional, altamente diferenciado, muito frequentemente remunerado abaixo do salário mínimo nacional, devido a feriados, participações em formações, maternidade ou doenças (como se fosse possível manter a saúde desse profissional obrigando-o a trabalhar de segunda a sexta, sete a oito horas diárias, num exercício de elevada performance e concentração, sem direito a férias e pago a 10, 9, 8 ou menos ainda euros à hora).

Assim, importa agora neste período que se avizinha, e uma vez que, ao contrário de outros profissionais de saúde do SNS, não se vislumbrar que os atuais ministros venham a sentar-se a qualquer mesa de negociações para paliativamente tentar resolver o que não se mostraram competentes em resolver para os médicos dentistas desde setembro de 1979 com a criação do SNS, estar atentos às propostas de programas eleitorais dos diferentes partidos concorrentes às eleições de 10 de março de 2024, para perceber quais os que terão coragem de expor claramente intenção de criar uma carreira de medicina dentária no SNS adequada às competências médicas e cirúrgicas no âmbito da saúde oral, e não mais um conjunto de palavras e atos protelatórios.