sexta-feira, 14 de agosto de 2015

657. Associação Mundo a Sorrir já cuidou da saúde oral de 33 mil portugueses

Entre projectos de sensibilização, acções de rastreio ou mesmo tratamentos, a organização não-governamental (ONG) Mundo a Sorrir - Associação de Médicos Dentistas Solidários Portugueses chegou a mais de 163 mil pessoas ao longo dos seus nove anos de actividade – com intervenções em Portugal e em vários Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, como Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé. Só em Portugal, o presidente da ONG adianta que foram feitos quase 12 mil rastreios e mais de 21 mil tratamentos, sobretudo a populações vulneráveis. Miguel Pavão acredita que, de futuro, o trabalho passará cada vez mais pela “aposta na prevenção em saúde”, numa área “muito carenciada” no país.
No mês em que a Mundo a Sorrir completa nove anos de actividade, Miguel Pavão conta que o projecto, que nasceu de uma experiência pessoal de voluntariado que este médico dentista teve em Cabo Verde com a colega Mariana Dolores, acabou por caminhar para vários países e que continua a lutar por garantir o “direito universal de acesso” a cuidados de saúde oral, trabalhando junto dos grupos de maior risco, como idosos, crianças, grávidas ou pessoas com poucos recursos financeiros. De 12 voluntários iniciais, passaram para mais de 600, entre médicos, médicos dentistas, higienistas e nutricionistas. “Continuam a existir poucos cuidados em termos de saúde oral no país e pouca aposta na prevenção, mesmo em termos nutricionais. Temos um sistema muito voltado não para o direito à saúde mas para o direito a tratar da doença. Penso que é essa a grande viragem que temos de fazer, não tratar as doenças por si só mas olhá-las de forma interligada”, descreve o dentista, que salienta o trabalho feito neste sentido pelo Programa para a Inclusão e Vida Saudável da Mundo a Sorrir. O projecto, que conta com fundos europeus, já chegou através de acções de formação e de rastreios a 54 mil crianças e jovens e deverá terminar o ano com 70 mil.
Desde que começaram a trabalhar em 2005, só em Portugal já deram 2332 palestras de promoção de saúde e cuidados de higiene e é precisamente na “educação não formal e na introdução de conceitos de forma lúdica” que o especialista mais acredita. Para Miguel Pavão, a cobertura do país em termos de saúde oral tem melhorado, sobretudo com os chamados cheques-dentista, atribuídos a alguns grupos definidos como prioritários pelo Plano Nacional de Promoção de Saúde Oral. O problema, diz, é que a aposta tem estado pouco do lado da prevenção. “Só 3% dos orçamentos de saúde na União Europeia é que são dedicados à promoção e prevenção em saúde”, adianta, exemplificando que tratar um cancro oral, entre cirurgia, quimioterapia e radioterapia, pode custar 100 mil euros, um valor que diz que daria para fazer acções de formação nesta área em todo o país. A ONG não tem ligações directas ao cheque-dentista, mas o médico dentista diz que têm tido uma “lógica de concertação” e adaptado os programas para “ajudar a que políticas como esta sejam melhor executadas” e sem que o trabalho dos voluntários “se sobreponha ao que existe no Estado”. “Nem toda a gente sabe que tem direito aos cheques ou como os utilizar e nos rastreios e acções ajudamos nesse sentido”, ilustra.
As iniquidades no acesso a cuidados de saúde oral continuam a ser um problema em Portugal, com a maior parte dos tratamentos a realizarem-se fora do Serviço Nacional de Saúde. Aliás, em Junho a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) publicou um estudo onde se pronuncia sobre os cheques-dentista disponibilizados a alguns grupos de risco no âmbito do Plano Nacional de Promoção de Saúde Oral. No documento, a ERS defende que o programa deveria ser alargado a crianças e jovens de escolas privadas e também aos idosos não beneficiários do complemento solidário e ainda às grávidas que não são seguidas no Serviço Nacional de Saúde.
Por agora, só as crianças de 7, 10 e os jovens de 13 e de 16 anos que frequentam as escolas públicas têm direito a receber estes cheques no valor de 35 euros cada. Até aos seis anos os cheques só devem ser dados a casos graves. O estudo destaca, ainda, outros limites deste plano, como os que se prendem com a definição de um número máximo de cheques-dentista a atribuir a cada grupo. A ERS acrescenta, aliás, que a maioria dos médicos dentistas considera que o número de cheques e o valor destes “não são compatíveis com as necessidades dos beneficiários”.
Romana Borja-Santos