sexta-feira, 23 de outubro de 2015

662. Adolescentes não escovam dentes diariamente

Adolescente é rebelde, não só quando quer sair e voltar tarde, como na hora de escovar os dentes. Uma pesquisa feita pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, em Portugal, revelou que 20% dos adolescentes não escovam os dentes diariamente e apenas um em cada quatro escova os dentes duas ou mais vezes ao dia.
Segundo a professora de odontopediatria da Faculdade de Odontologia da USP, Mariana Minatel Braga, os problemas bucais mais comuns na adolescência são cárie e gengivite, resultados desse descuido com a higiene. “Muitas vezes, era uma criança que não tinha essas doenças e passam a apresenta-las devido às mudanças típicas da adolescência e da gradativa passagem de responsabilidade do pai para o filho”, diz.
Por outro lado, sabe-se que uma criança que teve cárie na infância tem maior probabilidade de ter cárie também na adolescência. “Isso é compreensível, pois a os maus hábitos ligados à saúde bucal tendem a perpetuar de uma fase para a outra, podendo, inclusive, se agravar na adolescência”, afirma Mariana.
Segundo a especialista, em relação às doenças gengivais, a adolescência pode ser uma fase em que tais problemas sejam facilitados em função das alterações hormonais. Entretanto, sem biofilme dental (placa), eles não ocorrem. “Além dos hormônios (que são facilitadores), deve haver descuido com a higiene, caso contrário, não ocorreriam tais tipos de manifestações”.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

661. PORTUGAL: Os médicos que não existem

Oficialmente, não há dentistas nos cuidados primários de saúde. A carreira de médico dentista  nem sequer está prevista no SNS. Mas há milhares de portugueses que vão ao dentista no centro de saúde e agradecem. São contratados como técnicos, assistentes, administrativos ou com outros títulos profissionais. Uma situação que os coloca fora da lei.
Apesar da clandestinidade, são preciosos para muita gente. Atendem sobretudo doentes de risco, pessoas de menos recursos ou simplesmente quem os médicos de família determinam. Atendem os que podem, porque nalguns agrupamentos de centros de saúde, chega a haver um dentista para 500 mil pessoas, ou mais. Às vezes há critérios para definir quem deve ser atendido, outras vezes não. Serão poucas dezenas, os médicos dentistas nos centros de saúde. Ao certo ninguém ainda conseguiu contá-los. A maioria dos pedidos de informação feitos às Administrações Regionais de Saúde ficaram sem resposta. As excepções são o Alentejo, que diz não ter qualquer dentista nos centros de saúde, e o Algarve, refere que há apenas um, no centro de saúde de Faro.
Os últimos dados disponíveis mostram que há alguns dentistas nalguns centros de saúde, mas também mostram que o número de consultas desta especialidade tem vindo sempre a diminuir. A região de Lisboa e Vale do Tejo, a Administração Regional de Saúde afirma, por escrito, que o Programa de Saúde Oral, em vigor nesta zona, inclui apenas os cheques-dentista. Os dados oficiais mostram, no entanto, que há uma Unidade de Medicina Dentária que recebe utentes de vários centros de saúde da capital. Trabalham aqui 7 dentistas e 1 estomatologista. Não fomos autorizados a fazer reportagem.
A Unidade faz parte dos Serviços Partilhados do Agrupamento de Centros de Saúde de Lisboa Central. Está aberta das 8 da manhã às 8 da noite. A sala de espera é um lugar tranquilo, confortável. Percebe-se que muitos são utentes habituais. Todos chegam por indicação do seu médico de família e aqui são seguidos pelo “seu” dentista. Há crianças, idosos, doentes crónicos mas também quem simplesmente não pode pagar um dentista privado. Os profissionais desta unidade de saúde não foram autorizados a prestar declarações.
Quem são e como trabalham – José Frias Bulhosa optou por não ter consultório privado. Trabalha no Centro de Saúde de Aveiro, e não só. “No meu Agrupamento de Centros de Saúde sou o único dentista para 369 mil habitantes. Fui colocado em Vagos há 3 anos, o equipamento não estava a funcionar. Para não estar parado fui dar consultas a Aveiro. Vou quando os equipamentos estão livres, quando os higienistas não estão a usar.” Entre cá e lá, não faltam casos reveladores da falta que os dentistas fazem. “Ainda há meses identifiquei uma mulher com um dente no céu da boa. O médico de família nunca tinha reparado. A senhora, teria uns 35, 40 anos, não sabia o que era. Também me estou a lembrar de uma de 4 anos com 20 dentes e que  precisava de intervenção em 18.”
Os utentes são encaminhados pelo médico ou pelo enfermeiro de família. “Caso contrário seria humanamente impossível. A excepção são os casos em que há suspeita de lesão maligna, esses vejo sempre, a qualquer hora. Agora com o cheque-dentista para estas situações já posso encaminhar estas pessoas para outro local.” José Frias Bulhosa também atende as crianças da região que já esgotaram os cheques-dentista a que tinham direito e as que frequentam escolas privadas, que não recebem estes cheques.
Os casos mais difíceis, diz José Frias Bulhosa, são os de “adultos com patologia, transplantados, com problemas imunológicos. Estas pessoas raramente aparecem com uma cárie, geralmente precisam de tratar 20 ou 30 dentes.” A maioria dos dentistas que trabalham em centros de saúde sabem que o seu lugar pode ser eliminado a qualquer momento. Não convém arranjar pretextos. Optámos, por isso, por não identificar os médicos dentistas que se seguem.
“António” é médico dentista, trabalha num centro de saúde da região centro, mas não exerce, é técnico superior da carreira geral. “Já trabalhei como dentista, mas era ilegalmente, não posso, se acontecer alguma coisa…..
“Num centro de saúde da grande Lisboa “Joana” fala dos riscos de trabalhar assim.  “Sou técnica superior, já me disseram que não posso anestesiar sem autorização do médico, a verdade é que tirando a nossa consulta, não há nada nesta zona. Somos 3, mas já fomos apenas dois dentistas para 400 mil habitantes e o nosso Hospital de referência, o Amadora-Sintra, não tem a especialidade de estomatologia.” Esta consulta é para doentes de risco: diabéticos, cirúrgia cardíaca, transplantados, doentes oncológicos. “Mesmo assim, os médicos de família também nos
enviam abcessos.” Para muita gente, estes dentistas são o primeiro e o último recurso.
“Joana” não precisa de puxar pela memória para dar alguns exemplos: “Apareceu-me uma miúda de 13 anos com uma fístula, por baixo do queixo, a drenar pús há mais de 6 meses. Era um abcesso externo gigante. Também é comum aparecerem grávidas a quem os médicos hesitam em dar cheques dentista, por receio dos tratamentos durante a gravidez. Depois há aquelas pessoas que entram no círculo vicioso: não conseguem emprego por terem os dentes estragados, entram na consulta para tirar 5 e 6 raízes de uma vez, mas não podemos dar próteses e elas também não as podem pagar. Também chego a ter doentes que desistem da consulta por já não terem isenção da taxa moderadora.”
A carreira de médico dentista não existe no Serviço Nacional de Saúde, não está portanto previsto que existam nos centros de saúde, mas a tabela de preços oficial está lá afixada. Num centro de saúde é cobrada como consulta de especialidade hospitalar, custa 7,75 euros, e a extracção de um dente, por exemplo, custa mais 3,5 euros.
Cheques-dentista sim, dentistas não – Oficialmente, todos os cuidados de saúde oral, no âmbito dos cuidados primários de saúde são prestados por mais de 3 mil dentistas privados que aderiram ao Programa Nacional de Saúde Oral. O modelo é o do cheque-dentista, um vale para consulta e tratamentos que é disponibilizado a crianças, idosos de baixos rendimentos, doentes com VIH-Sida, grávidas e a quem apresente sinais ou suspeitas de lesões malignas na cavidade oral. Rui Calado, diretor do Programa Nacional de Saúde Mental explica que poderão vir a ser incluídos novos beneficiários do cheque-dentista, mas só quando houver garantia de “financiamento sustentável”. Quanto à inclusão de médicos dentistas no Serviço Nacional de Saúde, os custos são considerados “incomportáveis”.
Dora Pires