quinta-feira, 2 de outubro de 2008

299) Análise ao Estudo Nacional de Prevalência das Doenças Orais 2008 (4ª Parte)

A introdução do Estudo Nacional de Prevalência das Doenças Orais 2008
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Na introdução ao Estudo Nacional de Prevalência das Doenças Orais 2008 faz-se referência à “diminuição significativa da cárie dentária em Portugal, especialmente na população infantil e juvenil.” Este facto estará directamente relacionado com a evolução socioeconómica da sociedade portuguesa, nomeadamente com a alteração das estruturas etárias, o alargamento do poder de compra da classe social média, o aumento da população escolarizada e à expansão dos cuidados médicos pelo território nacional.
No entanto, o estudo reconhece que actualmente “a cárie dentária tem uma elevada prevalência e constitui, ainda, um problema de saúde pública, com uma clara distribuição assimétrica” frisando que “as mudanças de comportamento requerem acções integradas de promoção da saúde e prevenção das doenças crónicas, entre as quais se incluem as doenças orais.” Não deixa de ser curiosa esta última análise, onde se alerta para a necessidade de acções integradas no país, algo que infelizmente muito pouco foi feito no nosso país nos últimos trinta anos.
Descreve a introdução do documento de que desde 1986 surgiram programas de promoção das doenças orais destinadas a crianças e jovens, especialmente em jardins de infância e escolas; infelizmente a realidade dos últimos vinte anos mostrou que esses programas foram quase sempre localizados e abrangeram uma ínfima parte do universo infantil e juvenil, descurando a esmagadora maioria dos mais necessitados. Ainda hoje pode-se esperar três anos pela primeira consulta em algumas unidades de saúde publica que oferecem a valência de estomatologia. Portanto, o contributo desses programas sob orientação da Direcção-Geral da Saúde pouco ou raro impacto traduziram na dura realidade vivida no terreno.
Pena é que as boas vontades das campanhas desenvolvidas nestes últimos vinte anos pelos serviços da Administração Central se tenham pautado essencialmente por orientações e práticas meramente teóricas que muitas vezes nunca chegaram ao público-alvo.
Ao ler a introdução do estudo, muitas questões se levantam. Qual a percentagens de crianças e jovens que foram, a nível nacional e entre 1987 e 2005, acompanhadas na toma de fluoretos e na realização de bochechos com uma solução de fluoreto de sódio, efectuado quinzenalmente na escola? 5 %? 25 %? 90%?
Qual foi o número de crianças que, aos 7 aos 13 anos, tiveram a aplicação de selantes de fissura em dentes molares permanentes, no período compreendido entre 1987 e 2005? Qual a evolução do número de higienistas orais que foram integrados no serviço Nacional de Saúde e o número de crianças que lhe foram atribuídas para aplicação de selantes de fissuras nos dentes permanentes?
É muito fácil que os Ministérios da Educação e da Saúde publiquem os números; depois basta dividir pelo universo da população daquelas idades e fica-se a conhecer o verdadeiro impacto dos programas que foram desenvolvidos sob supervisão da Direcção-Geral de Saúde.
A partir de 1999 foi seguida uma estratégia de contratualização de médicos dentistas e estomatologistas do sector privado para “o tratamento de lesões de cárie dentária que a prevenção não conseguiu evitar e a aplicação de selantes de fissura nos mesmos grupos etários, quando os Centros de Saúde não dispunham de higienistas orais” , em crianças dos 6 aos 16 anos. Quais os profissionais que aderiram a esse tipo de programa, onde prestam esse serviço e como é que uma criança ou um jovem pode ser atendido? Já passaram 9 anos desde o início desta estratégia e torna-se premente levar essa informação a todas as escolas do país e passar a informação a quem dela realmente precisa.
Só colocando os programas à disposição dos necessitados é que realmente conseguirmos ganhar a batalha da promoção da saúde oral no nosso país; travar ou esconder informação atira por terra qualquer boa intenção que se pretenda. Utilize-se a televisão pública para dar essas informações todas que, quase sempre, nunca chegam aos nossos estudantes; a boa vontade está nas mãos da Direcção-Geral da saúde e do Ministério da Educação. Ou será que teremos de continuar a partir pedra mais durante vinte anos?

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