Três em cada dez pessoas em
Portugal não têm acesso à saúde oral, alertou hoje o bastonário dos dentistas,
relatando casos "calamitosos" como jovens de 25 anos sem nenhum dente
e idosos que nunca entraram num consultório. Ao longo de quatro dias, Miguel
Pavão avaliou no terreno as condições dos médicos dentistas que trabalham em
várias unidades de saúde das cinco Administrações Regionais de Saúde (ARS) do
país, num roteiro que terminou hoje com uma visita ao Centro de Saúde da
Damaia, concelho da Amadora, distrito de Lisboa.
No centro de
saúde, onde estava presente o presidente da ARS de Lisboa e Vale do Tejo, Luís
Pisco, o bastonário da Ordem dos Médicos Dentistas (OMD) fez um balanço do
roteiro "Medicina Dentária no SNS", começando por alertar que a meta
do "Projeto saúde oral para todos" para 2020 não foi cumprida. O
objetivo era que todos os centros de saúde tivessem a possibilidade de ter um
médico dentista, mas em 2021 a OMD "foi ao terreno, viajou pelo país, e
percebeu que esse desígnio está por cumprir", disse Miguel Pavão à agência
Lusa. Apenas 40% do território está coberto em termos de assistência médica
dentária, assinalou, justificando que, dos 278 centros de saúde previstos, só
132 estão a funcionar com gabinete dentário.
Durante o
périplo, Miguel Pavão observou situações de "saúde oral muito
calamitosas": "Há jovens de cerca de 25 a 30 anos que já não têm
qualquer dente na boca. É preocupante nos dias de hoje assistirmos a esta
realidade". Por outro lado, no interior, há "pessoas de muita
idade" que nunca tiveram oportunidade de ir ao dentista, disse, defendendo
que esta "é uma oportunidade" para finamente terem acesso à medicina
dentária. Contudo, defendeu, esta resposta precisa ser complementada com a
parte da reabilitação oral, que passa pelas pessoas poderem colocar próteses
dentárias, uma possibilidade que a OMD vai apresentar ao Governo, através de
parcerias público-privadas.
Miguel Pavão
explicou que os dentistas, que têm uma rede de prestadores privadas em todo o
país, podem prestar esse serviço de "uma maneira comparticipada, quer pelo
utente, quer pelo orçamento do Ministério da Saúde". Disse ainda ter
verificado durante o roteiro "uma grande discrepância" entre as ARS,
e que "não há verdadeiramente uma estratégia alicerçada e com orientação
para a medicina dentária".
O bastonário
referiu que o Centro foi a região onde viu "muito défice e muita
dificuldade para a questão da saúde oral", mas ressalvou que "não é
bom" comparar quem "vai mais avançado". Mas disse há "bons
exemplos" que podiam ser replicados: "Em Lisboa e em Castelo Branco
vi unidades de saúde oral criadas que têm de ser um exemplo precursor daquilo
que se vai escalar, disseminar e difundir para que a medicina dentária seja uma
realidade vigorosa e uma resposta capaz que os portugueses confiem". "Os
médicos dentistas têm uma rede de prestação privada muito importante, há
comparticipações e modelos que estão em vigor e há outros que podem ser
criados, mas esta resposta no SNS não duplica resposta, porque 30% da população
portuguesa não têm cuidados e ainda não tem acesso ao médico dentista",
vincou. Trata-se de "uma população socialmente desfavorecida", que
abrange 2,3 milhões de portugueses que necessitam de apoios de saúde oral, que
"é fundamental para a inclusão social e para a empregabilidade",
disse, considerando que esta "é uma causa nacional.
Presente na
visita, Inês Monteiro Filipe, dentista numa unidade de saúde pública, e que faz
parte do grupo regional de Saúde Oral da ARSLVT, defendeu que é preciso
garantir equidade de acesso à população. "Nós temos concelhos com uma
densidade populacional grande e com um dentista e temos concelhos com densidade
populacional mais pequena com um dentista também e, portanto, não garante a
equidade de acesso", salientou. Segundo a dentista, o projeto a médio e
longo prazo é aumentar a capacidade de Medicina Dentária nesses concelhos para
chegar a uma altura em que não haja um médico dentista de família, mas sim
"um médico dentista para a maior parte da população que tem essa
necessidade". Atualmente, disse, "estamos com 37 gabinetes já
montados em 26 concelhos, são 52 na ARSLVT, e até ao final deste mês, esperamos
a abertura de mais 12 e até ao final do ano a abertura, senão de todos, da
maior parte".
HN // HB
SAPO