quinta-feira, 27 de julho de 2017

700. Cheque-dentista: o que é, como funciona e quem tem direito



Criado em 2009, o Programa Nacional de Promoção de Saúde Oral começou por abranger crianças e jovens até aos 16 anos que frequentassem escolas públicas ou instituições particulares de solidariedade social (IPSS). Posteriormente foi alargado a grávidas, idosos, pessoas infetadas com VIH, crianças e jovens de 7, 10 e 13 anos com necessidades especiais de saúde.
Em 2018 vai ser disponibilizado um boletim de saúde oral eletrónico, medida incluída no programa Simplex +. Este documento será disponibilizado no portal do SNS. A partir dessa altura os cheques-dentista serão também emitidos por via digital, chegando aos utentes por sms ou e-mail. A quantidade de cheques que cada grupo de beneficiários tem direito é definido pelo Ministério da Saúde. O objetivo desta medida é evitar o extravio dos cheques e aumentar a utilização dos mesmos.
Quem pode beneficiar dos cheques-dentista?
– Crianças até 6 anos em situação considerada grave, tendo em conta critérios como dor e grau de infeção em dentes temporários, pode ser atribuído um cheque-dentista por ano;
– Crianças que frequentam as escolas públicas ou IPSS: aos 7 e aos 10 anos têm direito a 2 cheques-dentista, para igual número de consultas. Aos 13 anos estão previstas 3 consultas. O primeiro cheque é fornecido através da escola e os seguintes pelo dentista. Aos jovens com 15 anos completos, que tenham sido utentes beneficiários do PNPSO e seguido o respetivo plano de tratamentos aos 13 anos de idade, pode ser atribuído um cheque-dentista por ano letivo;
– Crianças e jovens de 7, 10 e 13 anos com necessidades especiais de saúde, nomeadamente portadores de doença mental, paralisia cerebral, trissomia 21, entre outras, que não tenham ainda sido abrangidos pelo PNPSO;
– Jovens de 18 anos, desde que tenham sido beneficiários do PNPSO e concluído o plano de tratamentos aos 16 anos;
– A partir dos 65 anos, quem recebe o complemento solidário para idosos beneficia de 2 cheques anuais para tratar os dentes;
– As grávidas seguidas no Serviço Nacional de Saúde usufruem de 3 consultas, que podem ocorrer até 60 dias após o parto. Serão atribuídos pelo médico de família;
-No caso dos pacientes com VIH, o programa prevê 6 cheques. O primeiro é atribuído pelo médico de família e os restantes pelo dentista. Os cheques também abrangem os pacientes com VIH que já tenham sido abrangidos pelo PNPSO e não fazem tratamento há mais de 24 meses;
– Pacientes de alto risco (por exemplo, quem já teve tumores, os fumadores e os grandes consumidores de álcool) ou com lesões suspeitas na boca têm direito a dois cheques-diagnóstico anuais no valor de € 15 cada e, em caso de necessidade, outros dois para a biopsia (cada cheque no valor de 50 euros). O processo de atribuição do cheque é desencadeado pelo médico de família;
Onde pode utilizar?
Os cheque-dentista podem ser utilizados em qualquer médico dentista aderente, em consultórios ou clínicas de medicina dentária privados. Não têm qualquer restrição relativamente à área de residência do utente, podendo ser utilizados em qualquer local de Portugal continental. Consulte a lista de médicos dentistas aderentes na página daDireção-Geral da Saúde.
O âmbito de utilização dos cheque-dentista prevê a promoção da saúde oral, a prevenção e tratamento das doenças orais. Na utilização do cheque-dentista, para cada grupo beneficiário e no âmbito do tratamento, existe um conjunto de atos específicos próprios. Nomeadamente, no caso das crianças, o programa apenas contempla o tratamento de dentes definitivos, excepto no cheque-dentista destinado a crianças com idade inferior a sete anos.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

699. A importância da Medicina Dentária no SNS

Desde a década de 80, quando terminei a minha licenciatura em Medicina Dentária, que ouço falar da importância de termos médicos dentistas a prestar cuidados de saúde oral no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Nessa altura, todos os que terminavam o curso de medicina dentária começavam de imediato a trabalhar. Todos! Os que eram muito bons alunos, os “médios” e até os menos habilidosos. Todos conseguíamos ter trabalho. E todos, ou quase todos, no exercício privado da profissão.
Mas essa abundância de trabalho e a facilidade com que nos instalávamos no “mundo profissional” não impediu, desde essa altura, que os primeiros dirigentes da Associação Profissional dos Médicos Dentistas (APMD) se batessem para fazer ver ao poder político de então o quão importante era a entrada de médicos dentistas no serviço público de saúde para que, desse modo, pudessem, largas franjas da população, ter acesso aos cuidados de saúde oral. Desde a primeira hora que os responsáveis máximos da APMD, nesse tempo liderada pelo Prof. Doutor João Carvalho, tudo fizeram para se conseguir esse objectivo. Note-se, pelo atrás referido, que não era por termos alguma dificuldade em trabalhar, mas sim porque não podíamos ficar indiferentes ao facto de uma percentagem grande da população, muito mais que hoje em dia, não ter capacidade económica para aceder aos consultórios e às clínicas privadas.
Uma questão de justiça, consagrada na Constituição da República Portuguesa: “O direito á protecção da saúde é realizado através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito”. “Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação”.
Infelizmente, desde a sua criação, a medicina dentária foi excluída do Serviço Nacional de Saúde. Foi, portanto, com grande naturalidade que desde 1991, quando a APMD foi criada, este assunto fez parte das preocupações, das “lutas” e das negociações havidas com a tutela. Passaram mais de 25 anos. Não o foi por falta de empenho, ou falta de vontade, dos médicos dentistas e dos seus dirigentes que, com excepção de alguns casos dispersos no Continente e da realidade da Madeira e dos Açores, a saúde oral se manteve de fora do serviço público.
Foi porque os políticos, as pessoas com capacidade de decisão a esse nível, nunca quiseram dar o passo em frente e sempre preferiram ir adiando a decisão, servindo-se de uma grande variedade de desculpas para o fazer. Quero salientar, por ser verdade e por uma questão de justiça, que todos os bastonários, secretários-gerais e dirigentes da APMD e da OMD sempre defenderam e sempre se bateram para alterar este “estado das coisas”. Só que a classe política, primeiro não nos ouvia e depois, quando nos começou a ouvir, foi adiando a resolução do problema.
E assim se chegou a Janeiro de 2016 quando, em plena cerimónia de tomada de posse dos actuais órgãos sociais da OMD, o senhor Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Prof. Doutor Fernando Araújo, anunciou a intenção do seu Governo, de criar as condições para que a medicina dentária “entrasse” no SNS. Para tal, propunha dialogar com a OMD, para se chegar à tão desejada presença de médicos dentistas no SNS.
A solução proposta pelo Governo, em Abril do ano passado, não veio ao encontro das “nossas pretensões”, como é do conhecimento geral. Por esse motivo, decidiu unanimemente o Conselho Directivo da OMD não assinar com o Governo o protocolo que definia as condições do projecto-piloto de 2016 e que conduziu à entrada de 13 colegas, noutros tantos centros de saúde, para a prestação de cuidados primários de saúde oral. Mas, não tendo assinado o protocolo, entendeu também o Conselho Directivo da OMD manter abertas as portas do diálogo, de modo a ser ouvido e a poder contribuir para melhoraras condições dos cuidados prestados, caso o Governo decidisse, como veio a acontecer, prolongar o referido projecto-piloto, findo o primeiro ano.
Seria responsável outra posição? Seria sério termos “amuado” e termos fechado esta porta que se acabava de abrir? Mesmo que não se tenha aberto como todos queríamos? Efectivamente algumas melhorias foram conseguidas do primeiro para este segundo modelo de prestação de cuidados de saúde oral nos centros de saúde: os contratos a estabelecer passam preferencialmente de um para dois anos, de 13 centros de saúde podem passar para cerca de 50, a área geográfica deixa de ser apenas Lisboa, Vale do Tejo e Alentejo para abranger o Norte, o Centro e o Sul do país, os vencimentos do médico dentista e do assistente dentário são melhorados, etc.…
Todos temos a consciência que as condições actuais não são, ainda, as desejáveis e que muito mais há para fazer. Ninguém podia esperar que, depois de mais de 25 anos sem nada de muito relevante ter acontecido, de imediato, num ou dois anos, se alcançassem todas as condições por nós desejadas para o exercício profissional da medicina dentária dentro do SNS.
A recente decisão do Governo de formar um grupo de trabalho, que visa criar as condições para chegar à carreira de medicina dentária no SNS, deve concentrar os nossos esforços para, de uma forma séria e responsável, continuarmos a bater-nos por tão importante desiderato. Lembro que do programa eleitoral com que a actual direcção da OMD se apresentou a eleições, este ponto, referente ao serviço público no SNS, está como uma das prioridades.
É realmente importante assegurar que, mesmo para os mais desfavorecidos, para os mais pobres, possam haver, dentro do SNS, consultas de medicina dentária onde se prestem cuidados primários de saúde oral. Sabemos que este processo ainda vai demorar a dar frutos. Não criemos falsas expectativas. Vamos querer ouvir todos os órgãos sociais da OMD. Contamos com a colaboração de todos os médicos dentistas; vamos querer ouvir toda a classe numa consulta pública sobre esta matéria.
Os médicos dentistas portugueses são necessários, com uma carreira digna, no Serviço Nacional de Saúde. A população portuguesa merece, e precisa, que isso aconteça.
Dr. Pedro Pires, vice-presidente do Conselho Directivo da OMD