O programa de saúde oral no SNS iniciou-se com a promoção da saúde oral em meio
escolar, sendo alargado posteriormente a medidas preventivas e curativas. As
medidas preventivas foram introduzidas numa fase inicial com a entrada de
higienistas orais para o SNS. Como estes profissionais eram insuficientes para
as necessidades da população, a política adotada para colmatar este problema foi
a contratualização com os serviços privados de medicina dentária. Incluindo-se
assim para alem da aplicação de selantes de fissuras, também os tratamentos
dentários. Em 2008 este modelo contratual foi revisto e implementado o cheque
dentista.
Decorridos mais de 25 anos de
programa, as crianças e jovens portugueses ainda apresentam problemas de saúde
oral relevantes. Na amostra estudada verificou-se que aos 7 anos de idade,
apenas cerca de 45,5% das crianças apresentam a dentição livre de cáries. A OMS
preconizava que para 2010, 65% das crianças estivessem livres de cáries aos 6
anos de idade. De acordo com as orientações da OMS o índice de CPOD aos 12 anos
não deveria ultrapassar 1,5, à data de 2010. Nos dados recolhidos no estudo este
valor não é ultrapassado apenas nas crianças com 10 anos, mas aproxima-se (1,2),
sendo que aos 13 se atinge um valor largamente superior (2,1).
Os dados do estudo revelam uma
adesão de metade das crianças a um programa totalmente gratuito e tal como foi
demonstrado, aplicado a crianças que efetivamente tinham necessidades de saúde
oral e não fizeram uso do cheque dentista (24,7%). No entanto praticamente todas
as crianças que utilizam o cheque concluem o plano de tratamento. A exceção que
se verifica aos 10 anos relacionada com a erupção dos pré-molares sugere uma
revisão das coortes etárias de atribuição do cheque dentista.
O rastreio prévio das crianças
como um procedimento a adotar em todas as situações, podendo este ser efetuados
por higienistas orais contratados pelo SNS, significaria uma redução dos custos
do programa e permitiria assegurar serviços de saúde oral acessíveis às crianças
e aos jovens, que integrem estratégias universais, isto é, dirigidas a toda a
população, seletivas, quando pretendemos intervir sobre grupos de risco e,
indicadas, porque os que têm doença necessitam de cuidados orais regulares. A
definição de crianças de risco ou grupos de risco como base para a definição das
políticas de saúde é largamente defendida na literatura.
Considerando a evidência que os
métodos atuais e sistemas de prestação de cuidados orais são relativamente
ineficazes, caros. A missão da Administração de Saúde consiste em melhorar o
funcionamento e aumentar a eficiência e a efetividade das instituições de saúde,
promovendo os modelos de gestão que permitam uma maior autonomia administrativa
e financeira e a correspondente responsabilização dos respetivos órgãos de
gestão pela obtenção de resultados em termos de ganhos em saúde. Esta missão só
poderá concretizar-se, através do desenvolvimento de instrumentos de influência
e de critérios de acompanhamento e avaliação, que permitam apoiar a sua evolução
(Ministério da Saúde, 1998).
Os serviços de saúde são parte
integrante da estrutura política, económica e administrativa de qualquer
sociedade. A simples importação de um modelo assistencial para uma sociedade,
sem levar em conta as suas características pode ter efeitos negativos. O país
que importa os referidos modelos pode não ter capacidade para suportar os
custos. Exemplo desta prática é a aplicação de modelos de países desenvolvidos a
países menos desenvolvidos, assentes em medidas curativas, baseadas em
atendimento clínico por profissionais altamente especializados (Traebert,
1996).
As políticas deverão ser
orientadas para estratégias de promoção e prevenção em saúde pública. A questão
das doenças orais é simples e medidas de saúde pública baratas estão disponíveis
para as prevenir e controlar pois as causas são conhecidas: dieta, deficiente
controlo de placa, tabaco, stress e acidentes. O fator principal que torna o
tratamento dentário tão caro é a limitação resultante da postura “restaurativa”
dominante para tratar e prevenir a doença. Apesar da saúde oral ser o objetivo a
atingir foi desviada pelo tratamento dentário, que é uma estratégia e não um
objetivo. As estratégias de tratamento podem assegurar melhor cuidado para
alguns e uma dependência dos profissionais, mas pouco é feito em termos de
promoção da saúde e trabalho intersectorial. As abordagens com base clínica e
capital intensivo para tratar doenças são irrealistas dados os altos custos e
inadequada cobertura (Sheiham, 2005).
A Organização Mundial da Saúde
aponta para 2020, metas para a saúde oral que exigem um reforço das ações de
promoção da saúde e prevenção das doenças orais, e um maior envolvimento dos
profissionais de saúde e de educação, dos serviços públicos e privados.
Ações futuras para melhorar a
saúde oral e reduzir desigualdades requerem uma abordagem de saúde pública. A
prevenção clínica e a educação para a saúde oral isoladamente tem um efeito
mínimo e pode aumentar as desigualdades na sociedade. Um programa de saúde que
procure as causas profundas de uma pobre saúde oral, através de uma
implementação com um largo espectro de ações complementares é o melhor caminho
para o sucesso.
Estimar a necessidade de
cuidados de saúde oral é fundamental para a saúde pública. Até ao momento não se
registam progressos nessa área. Existem grandes deficiências nas abordagens
normativas das necessidades orais. Uma abordagem alternativa à convencional, a
abordagem sociooral que leve em consideração o impacto que o estado oral tem na
qualidade de vida, desejo das pessoas e comportamentos, a sua propensão para
alterar comportamentos e importância, evidenciando que o tratamento recomendado
é eficiente.
Os governos europeus estão a
fazer reformas nos seus sistemas de saúde oral para fazer uma análise profunda.
O grande desafio é a habilidade para controlar o que ocorre dentro do sistema.
Problemas como a indução da procura e excesso de tratamento. O desenvolvimento
de medidas apropriadas e apropriados mecanismos de incentivos são mais
importantes na aquisição de equidade e sucesso do que aumentar o número de
dentistas (Batchelor, 2005).
A análise económica do setor da
saúde poderá dar um importante contributo na tomada de decisões neste setor da
saúde. Apesar de alguma especificidade dos serviços de saúde oral, os mesmos
conceitos e métodos aplicados à compreensão dos serviços médicos podem ser
aplicados à análise dos serviços de saúde oral.
Teria sido importante perceber
as razões que levam à não utilização do cheque, através da aplicação de um
inquérito aos encarregados de educação. Este estudo pretende apenas ser um
contributo e o “despertar” do interesse para futuras investigações na área das
parcerias do serviço público com o serviço privado de medicina dentária em
detrimento de outras políticas.
Estela Maria Malheiro de
Castro
NOTA: O autor do deste
blogue publica excerto da tese tendo em conta o seu interesse para a sociedade
civil. Qualquer ilícito acerca da reprodução deste texto deverá ser comunicado
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