A Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa
(FMDUL) que levou a cabo um estudo de tratamento dentário a crianças da Casa
Pia, entre 1997 e 2006, defende que o mesmo "respeitou todas as leis,
regulamentos e convenções, nacionais e internacionais, relacionadas com os
aspectos éticos e de protecção de participantes humanos".
As declarações, feitas através de comunicado à imprensa,
surgem um dia depois de o secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança
Social ter solicitado ao Procurador-Geral da República (PGR) que apure se
existiu “algum ilícito criminal” na execução de um protocolo que levou ao
tratamento dentário de 507 crianças da Casa Pia de Lisboa.
Na participação, o governante refere que o estudo em causa
foi objecto de uma reportagem pela RTP, no passado dia 28 de Maio, denominada
As Cobaias e que nela é referido que as substâncias utilizadas nos tratamentos
eram “muito tóxicas”. No entanto, o "Casa Pia Study, como foi chamado, foinoticiado pelo PÚBLICO a 14 de Novembro de 2003. Diz respeito a um estudo
norte-americano sobre o uso de de amálgamas de mercúrio, os vulgares
"chumbos", nos tratamentos dentários com 500 crianças da Casa Pia.
Desde o primeiro dia, houve polémica – que se reacendeu agora, graças a uma
reportagem emitida pela RTP1 no final de Maio.
Como o PÚBLICO noticiou há nove anos, num trabalho que deu
direito a manchete e que se estendia por quatro páginas no interior da edição
de 14 de Novembro de 2003, não havia na altura ensaio nacional que pudesse
gabar-se de ter um orçamento tão avultado – nove milhões de euros. O "Casa
Pia Study" era, à data do seu lançamento, o mais caro projecto do National
Institute of Dental Research (NIDCR), um dos 27 centros de pesquisa dos
institutos nacionais de saúde norte-americanos.
O estudo The Casa Pia Study of the Health Effects of Dental
Amalgam in Children foi feito em parceria entre a FMDUL e a Universidade de
Washington, Seattle. Em simultâneo, nos EUA decorreu um estudo paralelo sob a
responsabilidade do New England Research Institute. Todos os materiais
utilizados, incluindo o amálgama dentário, consistiram em "materiais
comerciais devidamente certificados" e as técnicas utilizadas nas
restaurações dos dentes "respeitaram os protocolos padronizados".
A utilização do amálgama dentário "era e continua a ser
advogada por várias entidades internacionais". A saber: a Organização
Mundial de Saúde, a Federação Dentária Internacional, a Food and Drug
Administration (a organização norte-americana equivalente ao Infarmed
português), o Conselho Europeu de Dentistas e a Comissão Europeia.
Além de ter sido pedido consentimento aos alunos que
participaram, A FMDUL pediu ainda autorização aos pais e responsáveis legais e
os dois provedores da Casa Pia, Luís Rebelo e Catalina Pestana, deram também autorização.
"Ao contrário do que é afirmado na reportagem, não
foram restaurados 16 dentes por aluno, mas 16 superfícies. O número médio de
dentes restaurados por aluno foi entre cinco e seis", diz o comunicado. A
segurança dos alunos e os resultados intercalares foram "sujeitos a
monitorização permanente por parte de uma comissão independente formada por um
grupo de peritos nas várias áreas de interesse do estudo. Esta comissão tinha a
responsabilidade e o poder de interromper o estudo".
Entre 2005 e 2007 foi feita uma auditoria aos aspectos
éticos e de protecção dos participantes pelo Office for Human Research
Protections, um órgão do governo federal norte-americano, por causa de uma
queixa que incluia aspectos abordados na reportagem. Essa auditoria concluiu
que as queixas eram "improcedentes" e o processo foi arquivado
"definitivamente".
PÚBLICO
* * *
Independentemente dos ilícitos que possam ter ocorrido com a
experiência mencionada na notícia, é extremamente lamentável e revela completa
falta de ética e imoralidade ver um o secretário de Estado da Solidariedade e
da Segurança Social estar preocupado com uma situação ocorrida no passado e não
fazer uma exaustiva auditoria aos actuais programas de saúde oral que tratam
menos de 10 % das necessidades de saúde oral e dentária das crianças e jovens
portugueses, descriminando a esmagadora maioria a quem deveria ser dirigido o
programa.
A demagogia e a vergonha devem ter limites para determinados
políticos.
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